sábado, 7 de junho de 2008

Frases que ficam

Têm umas frases que me vêm à cabeça recorrentemente. Às vezes elas desaparecem por um tempo um pouco maior que o de costume, mas sempre me voltam hora ou outra. Chamo essas de “frases que ficam”. Tenho uma coleção delas na minha cabeça, coleção que não cessa de crescer, visto que interajo com amigos e estranhos que me dizem frases interessantes todos os dias. Mas curiosamente apenas algumas me voltam à cabeça, de uma forma assim meio aleatória, que não posso prever. A memória é coisa meio aleatória mesmo, não é?

Outro dia quando pensava sobre essas “frases que ficam”, percebi que até posso classificá-las por gênero, como se classificam as peças de uma coleção.

Têm, por exemplo, as que eu nunca entendi o propósito: “Nossa, você é feia mesmo”. Essa eu escutei numa festa, de um menino do meu colégio com o qual eu nunca havia falado. Coisa de adolescente, totalmente gratuita, mas que eu nunca entendi. Principalmente porque ele era na época a pessoa mais feia que eu já havia conhecido. Fiquei anos pensando nesse gesto de agressividade gratuita e nunca consegui entender direito. Não entendo a agressividade. Mas acho que esse ocorrido acabou trazendo algo bom, ou pelo menos uma compreensão, afinal de contas foi graças a essa frase que entendi totalmente uma outra, de um cara famoso, “I'm so ugly that's ok 'cause so are you , broke our mirrors”. Naquela hora, eu entendi o sentido pleno dessa frase. Em outra ocasião fui achar a beleza e a representatividade da frase do Leonard Cohen “We are ugly but we have the music” (mas na verdade quando a encontrei já havia há tempos resolvido o meu problema com a beleza), que por si só é quase um hino.

Aliás, permitam-me o parêntese, Leonard Cohen é Foda! Pra Caralho (com letra maiúscula, que me perdoem os púdicos, mas não há adjetivo mais adequado para descrever o compositor)! Ele me lembra (fisicamente falando) Joãozinho, o meu maior amor musical! Mas isso é história pra outra hora pois essa rende. Poderia passar dias descrevendo todas as descobertas de vida que o violão de Joãozinho me trouxe, foram anos de entrega!

Me fez até suspirar agora, mas na verdade me trouxe à lembranca uma outra frase que ficou da época da minha descoberta tardia da bossa nova. Mostrava ao meu namorado uma das melodias mais lindas que eu já havia escutado, uma música de Tom Jobim, Dindi. E ele, num tom zombador de pessoa incrédula de beleza, às gargalhadas olha em minha direção e diz: “dim-dim? Ele gosta de dim-dim? Eu também! Hahahaha!”. Pobre criatura, não entendeu.

Existem aquelas frases despretensiosas, que por serem engraçadas ou às vezes até por razão nenhuma, ficam na cabeça. Sim, porque nem sempre as frases precisam de motivo para ficar, elas simplesmente ficam. Foi assim com a “de graça até ônibus errado”, dita assim num tom gozador, como uma piadinha esperta, mas que reverbera no meu cérebro toda vez que quero fazer alusão à gratuidade de algo. Me lembro de quem me disse e até do lugar e situação em que ela me foi dita pela primeira vez. Na verdade é assim com quase todas as frases que ficam. Me lembro detalhadamente do contexto em que ouvi cada uma delas. Então toda vez que repito uma frase que fica, me remeto àquela cena da vida que a minha memória selecionou para ser guardada. Como se a vida fosse um livro e as frases que ficam, as referências.

Por falar em livro, aproveito para entrar na categoria das frases de livros que ficam. A minha predileta, que eu sempre cito e que inevitavelmente sempre me vem mesmo sem querer (pois detesto ser repetitiva, e não precisa nem ser pros outros, pra mim mesma já acho chato, gosto de mudar o máximo possível sempre que posso. Mas é que realmente essa frase que ficou, não consigo não proclamá-la toda vez que tenho a oportunidade) é do Nabokov, lindo, que em sua autobiografia, ao falar sobre o reencontro depois de dez anos com uma de suas governantas e da intimidade que os dois ainda encontraram, diz que “Os verdadeiros amigos são aqueles que se reencontram depois de dez anos sem se ver e tudo se passa como se tivessem se visto no dia anterior”. Acho essa frase o máximo. Traduz a essência da intimidade. Por isso nunca consigo me conter ao pensar nessa referência.

Outra frase do mesmo escritor, a qual acho que faz o maior sentido e que sempre me vem à cabeça é: “Não entendo as pessoas que sentam num bar e não tomam o tempo de observar tudo e todos ao seu redor”. Essa se auto-explica.

Têm as frases trágicas, fortes demais para serem esquecidas, como “acho que nunca vou gostar de ninguém”, a qual inicialmente não compreendi e que ressoou em minha mente como um grande ponto de interrogação, mas que mais tarde fez todo o sentido. Representa a nossa eterna busca pelo amor e seus percalços.

Mas confesso que de todas as frases que guardo comigo, a mais importante, a que nunca esquecerei e que vai ecoar no meu coração pro resto da vida, é “Quer casar comigo?”.

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